quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Apenas dar colo...


       “Há momentos em que tudo o que a gente precisa é dar colo para o próprio coração.” 

Ana Jácomo

Sou normal!



"Já fui julgada até crucificada. Já fui enaltecida e muito amada. Já fui certa e errada. Já julguei e condenei. Me arrependi e me desculpei. Já fiz de tudo um pouco porque meu verbo é solto. Se sinto, preciso falar, se me incomoda tenho que questionar. Mal interpretada costumo ser mas o que posso fazer quando preciso dizer o que vai dentro do meu coração e bole com a minha emoção. Já fui injusta com quem não deveria ser e cruel com quem fez por merecer. Já fui bondosa e companheira. Já fui até a enfermeira de vidas que desabavam. Já fui bombas que estouravam em meio a guerras devastadoras. Já fui a doutora que curou um coração que se feriu por amor. Já fui a personagem esquecida e a atriz principal. Já fui recatada e imoral. Já fui alguém que o vento levou e que trouxe, de volta, por um favor. Já acertei e errei adoeci e me curei. Já pedi e implorei. Já cedi, vendi e dei. Já me culpei e me torturei por tantas coisas que nem sei. Já corri muito atrás mas era longe demais e não consegui chegar. Já rasguei lembranças que não prestavam mais. Já remexi o lixo para achá-las e de volta, na gaveta, colocá-las. Já fiz de tudo um pouco afinal sou normal, só não posso revelar o etc e tal."

Martha Medeiros

Que eu não me perca...



"Que eu perca a capacidade de amar,
de ver,
sentir.
Que eu continue alerta.
Que se necessário eu possa ter novamente o impulso de vôo no momento exato.
Que eu não me perca,

não me fira,
que não me firam,
que eu não fira ninguém.
Livra-me dos becos e poços em mim, Senhor.
Que meus olhos continuem alargando sempre."


Caio Fernando Abreu

Saudade é não querer saber... saudade é não saber!


imagem de Laurie Kaplowitz
Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, doem. Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim. Mas o que mais dói é saudade.

Saudade de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância. Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais. Saudade do pai que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu. Saudade de uma cidade. Saudade da gente mesmo, quando se tinha mais audácia e menos cabelos brancos. Doem essas saudades todas. 

Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama. Saudade da pele, do cheiro, dos beijos. Saudade da presença, e até da ausência consentida. Você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá. Você podia ir para o aeroporto e ele para o dentista, mas sabiam-se onde. Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la, mas sabiam-se amanhã. Mas quando o amor de um acaba, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.

Saudade é não saber. Não saber mais se ele continua se gripando no inverno. Não saber mais se ela continua clareando o cabelo. Não saber se ele ainda usa a camisa que você deu. Não saber se ela foi na consulta com o dermatologista como prometeu. Não saber se ele tem comido frango de padaria, se ela tem assistido as aulas de inglês, se ele aprendeu a entrar na Internet, se ela aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua fumando Carlton, se ela continua preferindo Pepsi, se ele continua sorrindo, se ela continua dançando, se ele continua pescando, se ela continua lhe amando.

Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.

Saudade é não querer saber. Não querer saber se ele está com outra, se ela está feliz, se ele está mais magro, se ela está mais bela. Saudade é nunca mais querer saber de quem se ama, e ainda assim, doer.

 Martha Medeiros

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Nem tudo...



Nem tudo que é vento voa 
Nem tudo que é tempo passa 
Nem tudo que é medo apavora 
Nem tudo que é esperança consola 
Nem tudo que é cansaço desanima 
Nem tudo que é só isola 
Nem todo amigo falha 
Nem todo amor fica 
Nem todo fogo alastra 
Nem toda fome mata 
Nem toda hora atrasa 
Nem todo corpo casa 
Qualquer pouca fé: Salva. 

Cáh Morandi

Haja o que houver...


Haja o que houver, aja.
Palavras quando não andam sincronizadas com nossos pés, não chegam a lugar algum. Não dizem absolutamente nada.
É na coerência das ações que a gente se encontra e o outro nos reconhece.
Ninguém pode viver preso em um discurso.
Ou seja,

Seja!

Fernanda Gaona

Tal como um lótus...


"... Não digais: encontrei a verdade". 
Dizei de preferência: "encontrei uma verdade". 
Não digais: "encontrei o caminho da alma". 
Dizei de preferência: "encontrei a alma andando em meu caminho". 
Porque a alma anda por todos os caminhos. 
A alma não marcha numa linha reta nem cresce como o caniço. 
A alma desabrocha, tal um lótus de inúmeras pétalas."

Khalil Gibran

sábado, 24 de novembro de 2012

Use a porta do lado!


Temos um nível de exigência absurdo em relação à vida; queremos que absolutamente tudo dê certo, e que, às vezes, por aborrecimentos mínimos, somos capazes de passar um dia inteiro de cara amarrada. Todo dia em nossas vidas passamos por isso. É quando um vizinho estaciona o carro muito encostado ao seu na garagem (ou pode ser na vaga do estacionamento do shopping). Em vez de simplesmente entrar pela outra porta, sair com o carro e tratar da sua vida, você bufa, pragueja, esperneia e estraga o que resta do seu dia. Este é um bom exemplo do que torna a vida de algumas pessoas melhor, e de outras, pior. Tem gente que tem a vida muito parecida com a de seus amigos, mas não entende por que eles parecem ser tão mais felizes. Será que nada dá errado pra eles? Dá aos montes. Só que, para eles, entrar pela porta do lado, uma vez ou outra, não faz a menor diferença. O que não falta neste mundo é gente que se acha o último biscoito do pacote. Que "audácia" contrariá-los! São aqueles que nunca ouviram falar em saídas de emergência: fincam o pé, compram briga e não deixam barato. Alguém aí falou em complexo de perseguição? Justamente. O mundo versus eles. Eu entro muito pela outra porta, e às vezes saio por ela também. É incômodo, tem um freio de mão no meio do caminho, mas é um problema solúvel. E como esse, a maioria dos nossos problemões podem ser resolvidos assim, rapidinho. Basta um telefonema, um e-mail, um pedido de desculpas, um deixar barato. Eu ando deixando de graça... Pra ser sincero, vinte e quatro horas têm sido pouco pra tudo o que eu tenho que fazer, então não vou perder ainda mais tempo ficando mal-humorado. Se eu procurar, vou encontrar dezenas de situações irritantes e gente idem; pilhas de pessoas que vão atrasar meu dia. Então eu uso a porta do lado" e vou tratar do que é importante de fato. Eis a chave do mistério, a fórmula da felicidade, o elixir do bom humor, a razão por que parece que tão pouca coisa na vida dos outros dá errado." Quando os desacertos da vida ameaçarem o seu bom humor, não estrague o seu dia... Use a porta do lado e mantenha a sua harmonia. Lembre-se, o humor é contagiante - para o bem e para o mal - portanto, sorria,e contagie todos ao seu redor com a sua alegria. A "Porta ao lado" pode ser uma boa entrada ou uma boa saída... Experimente !!!

Dr. Dráuzio Varella


Sempre...indefinidamente!


"Nada me prende, a nada me ligo, a nada pertenço.
Todas as sensações me tomam e nenhuma fica.
Sou mais variado que uma multidão de acaso,
Sou mais diverso que o universo espontâneo,
Todas as épocas me pertencem um momento,
Todas as almas um momento tiveram seu lugar em mim.
Fluído de intuições, rio de supor - mas,
Sempre ondas sucessivas,
Sempre o mar - agora desconhecendo-se
Sempre separando-se de mim, indefinidamente".

*

"Existe no silêncio, uma tão profunda sabedoria...
que as vezes ele se transforma na mais perfeita resposta."

Fernando Pessoa

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

E acredite!



O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos.

A cobiça envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódios... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e morticínios.

Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria.

Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco.

Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.

Charles Chaplin

Mais ou menos é a pior coisa...


"Me diga que está triste, eu consolo. Me diga que nunca foi tão feliz, eu concordo. Me ame ou me odeie. Me mande pra p. q o. p. que ou me convide pra ir com você. Exploda na minha cara ou se derreta na minha mão. Deixa eu te ver morrendo de tanto rir ou com vergonha das olheiras de tanto chorar. Só não me esconda o rosto. Me abrace, me esmurre, me lamba ou me empurre. Só não me balance os ombros. Não me perturba assistir tua dor nem acompanhar teu gás.Te ver mais ou menos realmente me incomoda. Mais ou menos não rende papo, não faz inverno nem verão, não exige uma longa explicação. É melhor estar alegre ou estar triste, mais ou menos é a pior coisa que existe."

Gabito Nunes

sábado, 17 de novembro de 2012

Abra o coração!



"Abra o coração. Estique o sorriso. Caminhe de mãos dadas. Enrole os braços em alguém. Coloque o coração pra perdoar. Diga palavras felizes ao acordar. Chore toda mágoa. Chore o mar inteiro. Balance uma criança.
Quando se pensa no futuro portas devem ser abertas por dentro, ficar brilhante. Hoje não é dia de arrumar as memórias. Hoje é o dia de começar de novo. Sonhar de novo."

Vanessa Leonardi

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Se parecem com o céu!


(...) É isto que amamos nos outros: o lugar vazio que eles abrem para que ali cresçam as nossas fantasias. Buscamos, no outro, não a sabedoria do conselho, mas o silêncio da escuta; não a solidez do músculo, mas o colo que acolhe...
Como seria bom se as outras pessoas fossem vazias como o céu, e não tão cheias de palavras, de ordens, de certezas. Só podemos amar as pessoas que se parecem com o céu, onde podemos fazer voar nossas fantasias como se fossem pipas...
 Rubem Alves

Organizando as gavetas internas...


Quieta, silenciosa, transitando lentamente pela casa, habitando o por dentro amplamente. Organizando meus livros, minhas gavetas internas, desarrumando outros espaços que de tão organizados me impossibilitavam novas manobras.
Ouvindo outras músicas, conhecendo outros ritmos, respeitando o meu espaço. Que me importa se é quase carnaval e todos os blocos estão na rua? Quero é o aconchego da quietude, da minha cama quente, o barulhinho frenético do teclado do meu computador.
E essa musiquinha calma que me embala, sussurra. Nada grita, nada desagrada, não há desconforto; apenas estou quieta, observando, percebendo outras sensações que não as já tão conhecidas.
Comendo quando tenho fome, dormindo quando sinto sono, lendo pra me alimentar do que gosto, escrevendo quando posso, enfim, desfrutando o aconchego do meu próprio colo…Falando pouco, um pouco séria, mas a minha alegria ainda impera, permeia tudo, o estado é de contentamento.


Se estou muito quieta e se recuso todos os convites para a pré-folia, não se incomodem, é a paz instalada no peito, e eu me fazendo a melhor das companhias… Claro que vasculhando tudo encontrei muitos fantasmas, mas, acreditem, existem muitos fantasmas bons.


(E me lembro do que escrevi pra alguém que um dia estava passando por um momento semelhante: que mãos vazias ainda são as melhores para se colher flores…)

Marla de Queiroz

Perguntar-se...


Perguntar-se é uma maneira interessante de se descobrir como pessoa,
Pois as perguntas são pontes que nos favorecem travessias "

Padre Fábio de Mello

Eu não sabia, Senhor...



Eu não sabia, Senhor, que o mundo era tão vasto e doloroso. E que, desejando a vastidão do mundo, meu coração conheceria também a vastidão da dor. Por que, Senhor meu, permitiste que eu tentasse fugir da minha pequenez? Por que me deste todos esses sonhos muito maiores do que eu?"                      Caio F. Abreu

Alivia a minha alma!


Alivia a minha alma,
fazes com que eu sinta que Tua mão está dada à minha,
fazes com que eu sinta que a morte não existe
porque na verdade já estamos na eternidade,
fazes com que eu sinta que amar é não morrer,
que a entrega de si mesmo não significa a morte,
fazes com que eu sinta uma alegria modesta e diária,
fazes com que eu não Te indague demais,
porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta,
fazes com que me lembre
de que também não há explicação
porque um filho quer o beijo de sua mãe
e no entanto ele quer
e no entanto o beijo é perfeito,
fazes com que eu receba o mundo sem receio,
pois para esse mundo incompreensível eu fui criada
e eu mesma também incompreensível,
então é que há uma conexão
entre esse mistério do mundo e o nosso,
mas essa conexão não é clara para nós
enquanto quisermos entendê-la,
abençoa-me para eu viva com alegria
o pão que eu como, 
o sono que durmo,
fazes com que eu tenha caridade por mim mesma,
pois senão não poderei sentir que Deus me amou,
fazes com que eu perca o pudor de desejar 
que na hora de minha morte
haja uma mão humana amada para apertar a minha,
amém.

Clarice Lispector

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Para todo fim, um recomeço!


       
"É loucura odiar todas as rosas porque uma te espetou. Entregar todos os teus sonhos porque um deles não se realizou, perder a fé em todas as orações porque em uma não foi atendida, desistir de todos os esforços porque um deles fracassou. É loucura condenar todas as amizades porque uma te traiu, descrer de todo amor porque um deles te foi infiel. É loucura jogar fora todas as chances de ser feliz porque uma tentativa não deu certo. 
Espero que na tua caminhada não cometas estas loucuras. Lembrando que sempre há uma outra chance, uma outra amizade, um outro amor, uma nova força. Para todo fim, um recomeço." 

                 
        Antoine de Saint-Exupéry

Do que se deve saber...




Amor não se implora, não se pede não se espera...
Amor se vive ou não.
Ciúmes é um sentimento inútil. Não torna ninguém fiel a você.
Animais são anjos disfarçados, mandados à terra por Deus para
mostrar ao homem o que é fidelidade.

Crianças aprendem com aquilo que você faz, não com o que você diz.
As pessoas que falam dos outros pra você, vão falar de você para os outros.
Perdoar e esquecer nos torna mais jovens.
Água é um santo remédio.
Deus inventou o choro para o homem não explodir.
Ausência de regras é uma regra que depende do bom senso.
Não existe comida ruim, existe comida mal temperada.
A criatividade caminha junto com a falta de grana.
Ser autêntico é a melhor e única forma de agradar.
Amigos de verdade nunca te abandonam.
O carinho é a melhor arma contra o ódio.
As diferenças tornam a vida mais bonita e colorida.
Há poesia em toda a criação divina.
Deus é o maior poeta de todos os tempos.
A música é a sobremesa da vida.
Acreditar, não faz de ninguém um tolo. Tolo é quem mente.
Filhos são presentes raros.
De tudo, o que fica é o seu nome e as lembranças a cerca de suas ações.
Obrigada, desculpa, por favor, são palavras mágicas, chaves que
abrem portas para uma vida melhor
O amor... Ah, o amor...
O amor quebra barreiras, une facções,
destrói preconceitos,
cura doenças...
Não há vida decente sem amor!
E é certo, quem ama, é muito amado.
E vive a vida mais alegremente...

Artur da Távola

domingo, 4 de novembro de 2012

Adeus, meu amor!



Logo nos desconheceremos. Mudaremos os cabelos, amansaremos as feições, apagarei seus gostos e suas músicas. Vamos envelhecer pelas mãos. Não andarei segurando os bolsos de trás de suas calças. Tropeçarei sozinho em meus suspiros, procurando me equilibrar perto das paredes. Esquecerei suas taras, suas vontades, os segredos de família. Riscarei o nosso trajeto do mapa. Farei amizade com seus inimigos. Sua bolsa não se derramará sobre a cadeira. Não poderei me gabar da rapidez em abrir seu sutiã. Vou tirar a barba, falar mais baixo, fazer sinal da cruz ao passar por igrejas e cemitérios. Passarei em branco pelos aniversários de meus pais, já que sempre me avisava. O mar cobrirá o desenho das quadras no inverno. As pombas sentirão mais fome nas praças. Perderei a seqüência de sua manhã - você colocava os brincos por último. Meus dias serão mais curtos sem seus ouvidos. Não acharei minha esperança nas gavetas das meias. Seus dentes estarão mais colados, mais trincados, menos soltos pela língua. Ficarei com raiva de seu conformismo. Perderei o tempo de sua risada. A dor será uma amizade fiel e estranha. Não perceberei seus quilos a mais, seus quilos a menos, sua vontade de nadar na cama ao se espreguiçar. Vou cumprimentá-la com as sobrancelhas e não terei apetite para dizer coisa alguma. Não olharei para trás, para não prometer a volta. Não olharei para os lados, para não ameaçá-la com a dúvida. Adeus, meu amor, a vida não nos pretende eternos. Haverá a sensação de residir numa cidade extinta, de cuidar dos escombros para levantar a nova casa. Adeus, meu amor. Não faremos mais briga em supermercado, nem festa ao comprar um livro. Não puxaremos assunto com os garçons. Não receberemos elogios de estranhos sobre nossas afinidades. Não tocaremos os pés de madrugada. Não tocaremos os braços nos filmes. Não trocaremos de lado ao acordar. Não dividiremos o jornal em cadernos. Não olharemos as vitrines em busca de presentes. O celular permanecerá desligado. Nunca descobriremos ao certo o que nos impediu, quem desistiu primeiro, quem não teve paciência de compreender. Só os ossos têm paciência, meu amor, não a carne, com ânsias de se completar. Não encontrará vestígios de minha passagem no futuro. Abandonará de repente meu telefone. Na primeira recaída, procurará o número na agenda. Não estava em sua agenda. Não se anota amores na agenda. Na segunda recaída, perguntará o que faço aos conhecidos. As demais recaídas serão como soluços depois de tomar muita água. Adeus, meu amor. Terá filhos com outros homens. Terá insônia com outros homens. Desviará de assunto ao escutar meu nome.

Adeus, meu amor.

Fabricio Carpinejar

Namoro de verdade é...



     
  "Quem não tem namorado é alguém que tirou férias remuneradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namoro de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, de saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil. Mas, namorado, mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o mais bonito, mas aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção dele não precisa ser parruda, decidida ou bandoleira: basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição. Quem não tem namorado, não é que não tem um amor: é quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes, mesmo assim pode não ter um namorado. Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema, sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho. Não tem namorado quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa é quem ama sem alegria. Não tem namorado quem faz pacto de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade ainda que rápida, escondida, fugida ou impossível de durar. Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas: de carinho escondido na hora em que passa o filme: de flor catada no muro e entregue de repente, de poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar, de gargalhada quando fala junto ou descobre a meia rasgada; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário. Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, fazer cesta abraçado, fazer compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor. Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira d'agua, show do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos e musical da Metro. Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos, quem não chateia com o fato de o seu bem ser paquerado. Não tem namorado quem ama sem gostar; quem gosta sem curtir; quem curte sem aprofundar. Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada ou meio-dia de sol em plena praia cheia de rivais. Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele. Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz.Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo, e quem tem medo de ser afetivo. Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e de medo, ponha a saia mais leve, aquela de chita, e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras, e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada, e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo da janela. Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uam névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteira: Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido. Enlou-cresça."
·          
     Carlos Drummond de Andrade

sábado, 3 de novembro de 2012

Os poucos e bons amigos...


"Entenda que amigos vão e vem, mas nunca abra mão de uns poucos e bons. Esforce-se de verdade para diminuir as distâncias geográficas e de estilos de vida, porque quanto mais velho você ficar, mais você vai precisar das pessoas que você conheceu quando jovem."

Pedro Bial

O nosso amor morreu...


O nosso amor morreu... Quem o diria!
Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta,
Ceguinha de te ver, sem ver a conta
Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria...
E outro clarão, ao longe, já desponta!
Um engano que morre... e logo aponta
A luz doutra miragem fugidia...

Eu bem sei, meu Amor, que pra viver
São precisos amores, pra morrer,
E são precisos sonhos para partir.

E bem sei, meu Amor, que era preciso
Fazer do amor que parte o claro riso
De outro amor impossível que há-de vir!

Florbela Espanca

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Gaiolas...há vários tipos!


 (...)"Gaiolas, há de vários tipos. As gaiolas de ferro – essas, é fácil perceber que são gaiolas. Mas há outras mais sutis, fantasiadas de ninhos, disfarçadas em proteção Deus dá as asas e o vôo. Os homens constróem gaiolas e ensinam a rastejar. Os construtores de gaiolas foram, um dia, pássaros. Mas tiveram medo das alturas. Tiveram medo de voar. Tiveram medo da liberdade. Suas asas, inúteis, ficaram tristes e caíram. E eles se transformaram, então, em criaturas rastejantes. A serpente um dia foi pássaro! 

Rubem Alves